Jared Alterman: Olá a todos, sejam bem-vindos! Nosso convidado esta semana é Chris Brewer. Chris é meu amigo e também um dos melhores jogadores de torneios do mundo. Tivemos uma conversa muito esclarecedora, cheia de ideias interessantes. Falamos também sobre sua aposta de corrida e tocamos no assunto política, antes de mergulharmos numa conversa profunda sobre poker.
– Como você está?
– Tudo bem. Amanhã viajo para a Coreia, estou me preparando para um mês intenso de poker. Estou tentando ajustar meu horário antecipadamente para conseguir dormir bem no avião – meu voo está marcado para as 11 da manhã.
– Parece que da última vez que esteve em Jeju você teve problemas para dormir?
– Não, nunca tenho problemas para dormir, o que aconteceu é que o ar não é muito bom por lá, e às vezes eu sentia quase que sufocando. Não é culpa deles – o vento carrega poluentes das fábricas chinesas, não há o que fazer. Além disso, comi muito pouco – jogávamos até as 11 da noite, e todos os restaurantes decentes fechavam por volta das 8. Quando voltei para casa, levei uma semana para me recuperar. Dessa vez estou preparado, levando comigo muita aveia instantânea. Sei que Stephen Chidwick leva comida desidratada. A questão da alimentação requer bem mais atenção do que se imagina, especialmente na primeira vez que se vai pra lá.
Dessa vez, em termos de poker, me preparei menos que o habitual, estive ocupado com outras coisas, mas em geral chego em boa forma. Jogar no Triton é sempre interessante, espero que tudo corra bem.

– Falando dessas outras coisas, você está se referindo à aposta da corrida? Não sei se você está pronto para falar disso.
– Isso também, mas principalmente joguei muito cash online, em diferentes formatos – Omaha de cinco cartas e coisas assim.
Quanto à aposta, claro que posso falar – eu apostei com Brandon Adams. No último outono eu estava numa forma terrível, não corria há talvez três anos. Brandon tinha acabado de perder uma aposta para Huck Seed e estava ansioso para tentar recuperar parte disso com alguém. Decidimos correr 5 km em janeiro. Se eu o vencesse por uma volta, ganharia um pouco; por duas voltas, ganharia bastante; menos de uma volta seria um pequeno prejuízo; e ele poderia ganhar muito se ganhasse. A última opção parecia completamente impossível, mas aconteceu por um motivo um tanto ridículo: basicamente, eu esqueci dessa condição!
Nossa corrida terminou comigo abandonando a prova a uma volta e meia do final, enquanto liderava por 325 metros. Ou seja, faltava cerca de um quarto de volta para ultrapassá-lo completamente. Mas claramente eu estava perdendo ritmo, e quando o treinador dele disse que ainda faltavam duas voltas e meia, isso me quebrou mentalmente. Eu abandonei e só percebi muito depois que, por isso, não perderia o mínimo, mas sim o máximo. Claro, foi meu erro. Tive um leve lapso mental. Embora o dia não estivesse particularmente quente para a Flórida – fazia 27 graus.
Eu poderia ter dado mais atenção aos treinos, mas ao invés disso viajei muito e joguei vários torneios – Montenegro, Bahamas… Levando tudo em consideração, não estava tão mal preparado, embora não estivesse brilhante. Mas abandonar a prova quando você está à frente realmente não era necessário.
Nas primeiras voltas, eu estava correndo num ritmo de 83 segundos por volta, o que estava de acordo com meu plano. Porém, após duas milhas, eu simplesmente desmoronei. A última volta fiz em 100 segundos. Minha frequência cardíaca nas primeiras voltas também estava normal, em 155, mas depois da primeira milha subiu para 188, e corri com esse pulso por 10 minutos. Isso corresponde a cerca de 97-98% da minha frequência cardíaca máxima, algo obviamente não recomendado. Quando vi esses números no relógio, pelo menos entendi que não havia abandonado sem motivo algum.
– Lembrando nossos espectadores: você correu profissionalmente na época da faculdade, certo?
– Sim, em um nível muito alto para o esporte universitário. Entrei na Universidade de Oregon, que para o atletismo é mais ou menos como Duke é para o basquete ou Alabama para o futebol americano. Ganhamos, se não me engano, seis campeonatos nacionais – dois ao ar livre e quatro em pista coberta. Não fui o melhor, mas era bem sólido – algo como o sétimo ou oitavo jogador da equipe de basquete de Duke.
– O que é incrivelmente impressionante para uma pessoa comum.
– É, acho que sim. Nos 1.500 metros, meu resultado foi 3:43; nos 3 km, 7:58. Provavelmente algo em torno do top-100 do país, mas eu treinava com atletas que estavam no top-20 ou top-40. Eu era o único no grupo que nunca conseguiu fazer uma milha em menos de quatro minutos.
Pouca gente sabe como a situação financeira no mundo da corrida é difícil. É um esporte extremamente cruel em relação ao esforço exigido e à recompensa financeira. Se você não fica entre os três primeiros no campeonato americano, não vai ao campeonato mundial. E sem o Mundial, seu contrato vale muito, muito menos. Dois dos meus colegas ficaram duas vezes em quarto lugar nas eliminatórias nacionais. Estavam a um passo de muito dinheiro e, claro, ir às Olimpíadas é o sonho de qualquer atleta. Se você não se classifica, volta para sua pista local e segue treinando até a próxima tentativa. O Mundial acontece a cada dois anos, as Olimpíadas a cada quatro, e a duração de uma carreira é de 10 a 12 anos.

– Acho que a competição também é absurda. Afinal, é um esporte básico: correr! Qualquer um pode correr.
– Claro que sou suspeito para falar, mas considero a corrida o esporte mais difícil de todos. De fato, qualquer pessoa pode correr, sem restrições. Perto disso está o futebol, porque conseguir uma bola geralmente não é problema. Até para o basquete você precisa de uma tabela com aro. Para o futebol americano, um monte de equipamento. Para a natação, precisa de uma piscina. Em todos os esportes há algum tipo de restrição. Mas quase todas as crianças do mundo podem correr. E se você é rápido, todos percebem isso imediatamente.
É por isso que considero Usain Bolt, com uma enorme vantagem, o maior atleta da história do planeta. Ninguém chega nem perto dele. Essencialmente, ele se tornou o melhor numa atividade praticada por praticamente todas as pessoas na Terra. Reconheço que Djokovic é um tenista espetacular e talvez o melhor da história do tênis. Contudo, é muito provável que tenha existido alguém com mais talento para o tênis que nunca tenha sequer tocado numa raquete.
Claro, nem todas as crianças rápidas seguem no atletismo. Algumas desistem, outras vão para o futebol, por exemplo. Mas, no geral, é muito mais fácil perceber um corredor talentoso do que um tenista promissor.
– Como você chegou ao poker? O que aconteceu?
– Antes da faculdade, eu não sabia absolutamente nada sobre poker e apostas em geral. Tudo aconteceu meio por acaso. Se repetíssemos minha vida infinitas vezes, as chances de eu acabar no poker seriam mínimas. Na maioria das vezes, eu seria treinador de atletismo em alguma faculdade ou então estaria trabalhando com finanças em Wall Street.
Em 2012, eu estava no primeiro ano da faculdade e comecei a jogar torneios de $3 com meus amigos. Era divertido, mas só isso. No ano seguinte, um colega decidiu ir a um clube de poker local, do qual eu nunca tinha ouvido falar, chamado Full House Poker. Um lugar incrível, mando um abraço a todos de lá; até hoje sou amigo dos donos do clube. Participamos de um torneio de equipes com regras bem curiosas. Era uma equipe de duas pessoas, cada um pagando $30, ambos recebiam stacks separados e, ao fim de cada nível, trocávamos os stacks com o parceiro. Não era permitido jogar na mesma mesa antes da mesa final, mas, na final, podia, e não havia restrições quanto ao uso de táticas de equipe.
Gostei muito desse formato, e começamos a frequentar o clube toda terça-feira. Ganhamos apenas uma vez; não diria que tivemos muito sucesso, mas era divertido demais. Em algum momento, comecei a me interessar pelo cash game. Em Oregon, assim como em Washington, se não me engano, os donos não podem cobrar rake diretamente dos cash games, então os clubes cobram uma taxa de associação anual dos jogadores, por exemplo, $300 por ano. Além disso, você paga uma taxa única ao se sentar à mesa. No Full House, pagávamos 5% do buy-in, limitado a $25. Então, você poderia entrar com $20.000 e pagar apenas $25 de rake pela noite inteira.
Foi assim que eu me vi jogando praticamente sem rake numa mesa de $1/$2. Situação surreal. No início, tive sorte e rapidamente ganhei $2.000, depois perdi tudo da mesma maneira. Eu jogava mal, mas ia ganhando experiência. Comecei a ler o fórum 2+2.
Na primavera do meu terceiro ano, fiquei doente e não pude treinar corrida por quase um mês. Toda minha preparação foi por água abaixo, minha temporada estava perdida. Nem fazia sentido ir aos treinos. Comecei a jogar mais poker, obtive sucesso estável de maneira inesperada, e o poker virou um trabalho, onde passei a ganhar $40 por hora jogando $1/$2 por três anos.
– Quando você começou a ter ambições mais sérias?
– Houve algumas etapas. A primeira foi perceber: "Uau, dá para ganhar dinheiro com isso, e é bem divertido!". A segunda foi pensar: "Talvez eu nem queira mais trabalhar!". Se eu ganho $40 por hora jogando $1/$2, jogando $5/$10 posso ganhar até $200 por hora. Trabalhando 40 horas por semana, eu ficaria rico!
Claro, no primeiro emprego após a faculdade, eu receberia muito menos. Meus pais aceitaram com tranquilidade a minha decisão; o importante era que eu tivesse um diploma universitário e nenhuma dívida. Talvez eles não acreditassem tanto que eu conseguiria, mas achavam que isso também seria uma experiência importante.
Aliás, é curioso como a atitude em relação ao jogo muda em diferentes culturas. Minha noiva é chinesa. A mãe dela é muito supersticiosa e acredita que, se estou sem sorte no jogo, a culpa certamente é da Julia. Eu não posso ser culpado pelo meu azar, afinal, sou branco e não faço ideia do que traz sorte ou azar. Mas Julia é chinesa e, portanto, deveria conhecer todos os detalhes da sorte. "Como você pôde deixar o Chris colocar os sapatos perto da porta? Isso é um péssimo sinal!"
Julia finge não acreditar em superstições, mas sempre nota quando ficamos num quarto com número da sorte. "Mas você não acredita nisso!", digo eu. "Vai que funciona mesmo...", responde ela.

– Na cultura americana, é normal alguém se considerar um milionário que está passando por dificuldades temporárias. Por algum motivo, todos nós achamos que a sorte está literalmente na próxima esquina.
– Não quero entrar na política, mas você já ouviu falar do livro What's the Matter with Kansas? (O que há de errado com o Kansas)? Uma das principais indústrias do Kansas é a agricultura, e os fazendeiros recebem subsídios do governo. Esses subsídios vêm predominantemente de políticos da esquerda. Seguindo essa lógica, o Kansas sempre deveria votar nos democratas, já que os agricultores têm interesse financeiro nisso. Mas eles nunca votam! O Kansas sempre vota nos republicanos. Os autores do livro tentaram entender o porquê e descobriram que os subsídios não beneficiam particularmente os maiores fazendeiros, pois permitem aos pequenos competir com eles com sucesso. E já que todo fazendeiro do Kansas tem plena convicção de que está destinado a se tornar grande, todos eles votam na política que será mais benéfica para eles quando ficarem ricos. E este é um exemplo típico da cultura americana. É assim que o nosso cérebro funciona. Quando perguntam se a economia está crescendo ou caindo, todos respondem que está caindo. Mas se perguntarem se sua situação pessoal estará melhor ou pior daqui a três anos, todos têm absoluta certeza de que as coisas vão melhorar. Os americanos são otimistas inacreditáveis em tudo que diz respeito a eles próprios.
– Não consegui fazer uma transição suave para o poker, mas tudo bem. É um problema de todos os meus podcasts. Quero te perguntar algo: ultimamente comecei a entender melhor o MTT (já jogo torneios há dois anos e meio) e me interessa uma questão estratégica. Me diz uma coisa: você gosta de sistematizar tudo? Usa uma estratégia básica a partir da qual constrói todas as adaptações? Enfim, me conta qual é a sua abordagem estratégica para o jogo?
– Com o passar dos anos, muita coisa mudou. Em geral, minha estratégia é bastante estruturada. Embora no pré-flop eu me permita jogar um pouco mais loose. Tenho uma convicção profunda de que as pessoas subestimam o pré-flop, considerando-o uma street chata e estática. Na minha opinião, é a street mais complexa e interessante do poker. E com grande vantagem sobre as outras.
– Continue!
– Bem, sabemos que as decisões no pré-flop se afastam bastante da equidade pura. Por exemplo, 65s tem 48% de equidade contra duas cartas aleatórias. Mas é óbvio que não é uma mão que está entre as 50% inferiores. Claro, isso não é nenhuma novidade. Todos sabem que 65s ganha valor por sua boa realização de equidade, acerto boards específicos e tenho capacidade de blefar. Em geral, a matemática do pré-flop é muito complexa.
Até mesmo a relação entre blefes e valor em stacks profundos é difícil. Não dá para dizer que temos realmente "blefes" no pré-flop, e sim mãos que cobrem boards diferentes e têm classes diferentes de equidade. As pessoas não entendem totalmente que o pré-flop permite criar um número infinito de estratégias equilibradas. Especialmente se começarmos a considerar leaks específicos dos adversários no pós-flop. Aí surgem muuuitas possibilidades estratégicas já no pré-flop.
Por exemplo, imagine que no Big Blind está sentado um cara que gosta de dar squeeze sempre que possível, com 25% das mãos. Sabendo disso, você perde o desejo de dar 3-bet contra o raiser inicial, porque é possível dar apenas call e, em 25% dos casos, ver um squeeze vindo do BB. Esse é um exemplo simples, mas já mostra como o pré-flop pode ser incrivelmente complexo e interessante. E ainda há limpers, diferentes sizings para isolar...
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Acho que sou um dos poucos que realmente testaram isso... Imagina que você está abrindo A9o do lowjack, que é o bottom do seu range. Se quiser, você pode foldar esse A9o e abrir no lugar dele 65o, e seu EV não vai diminuir em nada. Mas seus adversários terão que mudar a estratégia deles completamente, ajustar os calls, as 3-bets... toda a dinâmica do jogo muda. Ok, tecnicamente a estratégia com 65o será um pouco pior, mas essa diferença é tão minúscula que não afeta absolutamente nada. O solver mantém as frequências exatamente iguais.
Mudanças globais de estratégia como essa podem levar a ideias muito interessantes. Por exemplo, você pode começar a foldar KTo, mas continuar abrindo A9o e K9o – talvez só para complicar a vida dos seus adversários. O Big Blind terá que foldar muito mais por causa da dominação, mas aumentar a frequência de defesa com outras mãos marginais. Podemos tornar a árvore de jogo incrivelmente complexa sem reduzir o EV. E se você aprender a levar em consideração os leaks dos adversários no pós-flop, o pré-flop se torna absurdamente interessante. Jogar pré-flop puramente pelo GTO é uma preguiça vergonhosa! Temos tantas oportunidades para desvios, tanta coisa para levar em consideração. É isso aí!
– Muito interessante! Aliás, quando eu jogo cash game ao vivo, penso no pré-flop como uma street muito dinâmica...
– E você está certo, no ao vivo ela é realmente muito mais dinâmica. No online, até os fishes já consultam os charts. É engraçado, jogando online eu consigo perceber quando os fishes estão consultando ranges de pré-flop apenas pelo timing.
– Mas quando jogo torneios, tenho a sensação de que no pré-flop todas as decisões são ou corretas ou incorretas. É o que a minha intuição me diz. Se abro uma mão errada, sinto claramente que cometi um erro!
– Todo mundo tem essa sensação. Mas o verdadeiro erro é foldar uma mão que gera lucro. Agora, quando estamos no bottom do range, dá para escolher praticamente qualquer coisa. Abra o Monker ou GTO Wizard e veja o EV de um miniraise com 65o do UTG: vai ser algo como -0,01 BB. Claro, desde que você saiba como jogar pós-flop.
Estratégia de poker em um nível profundamente teórico é algo um pouco sem sentido, já que ninguém realmente joga assim, exceto os computadores. Quando você joga com 100 BB de stack efetivo, tem à disposição uma infinidade de sizings. Você pode considerar apostas de 10%, 11%, 12%, o que quiser. Alguns sizings obviamente serão descartados como impraticáveis, mas se levarmos isso a sério, podemos criar um número razoavelmente grande de estratégias equivalentes – e randomizar as decisões não apenas dentro de uma estratégia específica, mas entre diferentes estratégias também.
Imagine uma situação em que no flop você pode apostar com sizings de 33%, 50% e 67% em qualquer combinação, podendo usar de um a três desses tamanhos diferentes. A diferença de EV entre todas essas estratégias será praticamente zero, mas o computador que está jogando contra você não sabe qual delas você está utilizando e terá que adivinhar. Além disso, determinadas mãos marginais estarão no seu range numa estratégia, mas não em outra. Tudo isso torna o jogo infinitamente mais complexo.

– Gosto que o poker esteja se tornando gradualmente mais dinâmico e combativo. Acho que aquela fase em que todos tentavam repetir cegamente o solver já ficou para trás. Foi uma fase meio triste, porque duvido que alguém realmente quisesse um futuro desses. Mas agora parece que todo mundo entendeu que é impossível memorizar uma estratégia perfeita, e com isso, o jogo voltou a ser humano, incrivelmente complexo, cheio de espaço para ajustes e preferências pessoais.
– Pois é. Se quiserem um exemplo prático, abram qualquer simulação do GTO Wizard, retirem só 1% dos blefes e recalculem o ajuste ideal contra esse novo range. Ou adicionem 1% a mais. Em ambos os casos, vocês vão ver ajustes gigantescos.
Os seres humanos são imperfeitos e nunca se tornarão perfeitos, portanto, sempre haverá espaço para manobra, EV adicional, ajustes e exploração quando o jogo é entre pessoas reais.
Por outro lado, para muitos jogadores, bastaria simplesmente parar de jogar mãos fracas. Se você jogar mãos fortes, tudo vai dar certo.
– Recentemente eu estava revisando meu banco de mãos e decidi conferir uma coisa. Sempre tive certeza que fazia calls horríveis em blefes, perdendo muito dinheiro. Mas quando abri o banco, descobri que na verdade estou indo muito bem nesses calls! Minha intuição tinha falhado completamente.
– Uma das minhas histórias favoritas é sobre quando o Ike estava jogando mixed games high stakes online, e fez um acordo consigo mesmo: cada vez que ele acertasse um bom call no river, iria levantar e comemorar com uma dancinha. Isso porque nos jogos limit, calls no river quase sempre perdem. Mesmo que o jogador saiba racionalmente que está fazendo um call +EV, ainda que perca 9 vezes a cada 10, emocionalmente é sempre difícil aceitar isso.
– E se você acha que está indo bem nos bluff-catches, provavelmente está dando poucos calls!
– Sim, exatamente! Por causa dessas oscilações emocionais, é muito fácil desistir de fazer calls no river, afinal, você “sempre perde”, ou então exagerar numa exploração que não deveria fazer. Nossa, já perdi a conta de quantas vezes vi jogadores deixarem escapar torneios que estavam destinados a vencer porque resolveram aplicar algum ajuste emocional no lugar errado. E estou falando de excelentes jogadores, regulares dos high stakes! Qualquer um de nós pode cair nessa armadilha: confundir uma reação emocional com um bom ajuste estratégico. Jogadores fracos erram porque não conhecem o poker direito e não têm base nenhuma para análise além das próprias emoções. Já os jogadores high stakes erram porque as apostas se tornaram tão altas que eles não conseguem mais controlar suas emoções.
Enfim, como disse Doug Polk certa vez: “Acho que com essa mão, deveríamos dar call, raise e fold ao mesmo tempo!”
Eu pessoalmente não consigo aceitar bem meus próprios erros. Quando me sento na mesa, tenho a absoluta certeza de que preciso ser mais inteligente e habilidoso do que todos os meus adversários. Não estou dizendo que essa confiança seja racional, mas é como eu me sinto. Infelizmente, não sou inteligente nem habilidoso o suficiente para simplesmente destruir todo mundo. Eu sempre vou errar, para todos os lados, e não apenas eu – qualquer ser humano. Todos nós somos horríveis, e isso me deixa louco.
Mas os jogadores que se mantêm no topo por muitos anos, de alguma forma, aprenderam a acreditar em si mesmos apesar dos erros constantes. Eles cometem bobagens repetidamente, mas não desistem. Isso é uma habilidade rara e especial.
E ninguém é melhor nisso do que Ike. Para mim, ele é o número um da história do poker, meu GOAT. E ele é, de longe, o jogador que conheço que reage com mais calma aos próprios erros. É mais ou menos por aí.

– Quando você está disposto a correr riscos e cometer erros, parece que fica mais perto dos limites do seu conhecimento e consegue ampliá-los mais rapidamente.
– Exatamente. E você também pode estar certo! Ao arriscar, você se dá a chance de descobrir algo incrível.
– Recentemente assisti a um vídeo da GTO Lab em que você e o Nick Petrangelo analisaram uma mão. Não te surpreendeu a forma como ele randomiza as decisões? [Nota do Editor: Ele decide previamente se vai seguir uma linha passiva ou ativa caso a estratégia seja mista – nota GT.]
– Não me surpreendeu, afinal conheço o Nick há muito tempo. Acho que, do ponto de vista metodológico, o que ele faz é um erro. Mas não estou convencido de que seja um erro significativo o suficiente para fazer alguma diferença real.
O computador randomiza porque não quer que outro computador tenha decisões fáceis com certos blockers ou classes de mãos. Numa partida computador contra computador, isso faz sentido. Na vida real, não faz a menor diferença.
Aliás, isso me lembra uma coisa importante: não tenham excesso de respeito pelos adversários. Eles não são tão bons assim. Eu também não sou tão bom assim. Ninguém é bom o suficiente. Humanos simplesmente não foram feitos para jogar poker perfeitamente. Em vários spots, acabamos acreditando demais nos oponentes, presumindo que eles sabem e entenderam tudo. Mas na maioria das vezes, isso não é verdade. E mesmo se você estiver diante de um grande jogador de poker, não pode considerá-lo perfeito em todos os spots. Acredito que, se os jogadores demonstrassem mais desrespeito através de suas jogadas, aumentariam significativamente seu EV.
Não se trata de usar linhas específicas, passivas ou agressivas – é simplesmente reconhecer que todo mundo tem leaks gigantescos. Todos já tomamos check-raises em spots onde o oponente jamais daria check com uma mão de valor. Embora, em geral, check-raises sejam pouco blefados, existem situações em que alguém tenta representar um flush com o blocker de nuts, mesmo nunca tendo dado dois checks seguidos com nut flush draw na vida...
– Obrigado pela entrevista, foi muito interessante! Deixo para você as palavras finais.
– Caso alguém queira fazer coaching comigo, cobro $1.000 por hora ou $3.000 por cinco horas. É só mandar mensagem no Twitter ou no Instagram. Aceito um pagamento antecipado de $600, e se algo não agradar, podemos conversar. Costumo me adaptar bem, mas até hoje ninguém reclamou!