Há uma característica que separa os jogadores high stakes dos jogadores low stakes: ambição. Quem joga barato tem medo de colocar todas as fichas no pano sem o nuts, o que não é o caso de quem joga muito caro. Os melhores jogadores entendem que combinações de mãos muito fortes são raridades, então, quando você tem sorte de completar uma mão do tipo, você deve tentar conseguir o máximo de fichas.
É possível aprender a ser ambicioso? Bom, acontece que o solver que utilizaremos, o Drive Hud 2, é surpreendentemente ambicioso. Depois de analisar o jogo da Ariel, aprenderemos como jogar potes grandes da maneira mais eficiente possível.
Há muitas maneiras de analisar o Drive Hud 2. Uma delas é como apostar em cada uma das streets. Vamos ver como o Pluribus (robô desenvolvido para jogar GTO) usa frequentemente diferentes tamanhos de apostas no flop, turn e river. Nossa amostragem inclui c-bet, probe bets e delayed c-bets:
Como você pode ver, Pluribus faz overbets em todas as streets, mas a frequência vai aumentando do flop para o river.
Lembram-se da estratégia básica que a Ariel usava? Ela nunca apostava mais que o valor do pote:
Quando Ariel estava começando a aprender, nós queríamos reduzir a variância. Mas, agora, que ela já jogou cerca de seis mil mãos, está na hora de quebrar essas correntes.
Embora a amostragem seja pequena, é impressionante que mesmo praticamente sem ganhar dinheiro (break even), Ariel vence a maioria dos potes quando a mão vai para o showdown e perde a maioria quando a mão não vai.
Por si só, isso não é um problema, mas pode sinalizar imprecisão no tamanho das apostas. Especificamente, ela pode estar apostando muito pouco com as mãos fortes, o que faz com que seus oponentes paguem com muita frequência. Mas o que há de errado com isso? Bem, é claro que queremos que nossas apostas sejam pagas por mãos mais fracas, mas há um limite para essa lógica. Na teoria, podemos apostar 1 blind com o nuts e o número de calls será praticamente de 100%, mas nossa expectativa cairá.
Os melhores jogadores do mundo e os solvers são muito ambiciosos porque para maximizar o EV, eles têm que inflar o pote ao máximo, para isso, eles fazem grandes apostas com as mãos mais fortes. Ocasionalmente, isso resultará em oponentes dando fold em mãos com as quais eles pagariam apostas menores. Mas isso não há nada de errado nisso, se também fizemos essas apostas quando estivermos blefes.
Mas quando eu devo fazer uma overbet? Escolher o valor correto de uma aposta é uma das coisas mais difíceis no poker, mas existem fatores comuns quando você for fazer uma overbet.
Primeiro fator: escolher a street em que apostamos. No início do texto, vimos que as overbets aumentam do flop para o river. A razão é óbvia: no flop, ainda temos mais duas streets para apostar — e quanto mais perto do showdown, maior o nosso desejo de levar o pote.
O segundo é o SPR (stack to pot ratio). Pluribus faz quase todas as overbets em single-raise pots (SRP), ou seja, em potes que tiveram apenas um aumento. Em potes que houve uma 3-bet, geralmente, não há necessidade de overbets, já que o pote estará grande o bastante para que você consiga o stack do oponente com apostas menores
E por último, o gatilho para a overbet e fator principal para realizar a mesma: a nut advantage (em tradução livre, “vantagem para ter o nuts”), que é a proporção do seu range que terá acertado uma mão muito forte (dois pares ou maior).
Vamos pegar uma mão do Pluribus como exemplo. Ele abre do hijack com e é pago pelo buttton (BTN). No flop , Pluribus aposta metade do pote e é pago. O turn é um e Pluribus aposta duas vezes o pote. O BTN folda.
De acordo com o programa GTOX, Pluribus deve fazer uma overbet com mais de 30% do seu range no turn.
Isso porque o range de call do BTN não tem QQ, nem KK ou AA.
Em uma outra mão, o BTN abre e Pluribus paga do SB com . Os dois pedem mesa no flop , e então Pluribus aposta duas vezes o pote no turn, um , e o BTN folda.
Apesar de o BTN ter uma quantidade de mãos melhores que acertam o bordo, basicamente as trincas e pares maiores, o range de call do small blind (SB) é tão pequeno, que a proporção de mãos que acertam dois pares ou mais no seu range se torna maior.
Um última mão. Pluribus aumenta com do HJ, e o BB paga. O flop vem , e Pluribus vai para uma c-bet de 50% e é pago. O turn é , e Pluribus aposta duas vezes o pote.
Novamente, se jogarmos no solver, veremos que Pluribus tem a nut advantage e deve fazer uma overbet com 25% das mãos.
Reunindo todas as informações recebidas, nós desenvolvemos heurísticas tão simples para overbets que até um iniciante pode seguir.
Explicando a imagem: Ariel só vai fazer overbets nos turns, no rivers e em single-raise pots (SRP), ou potes sem 3-bets. Ela também deverá ter muitas mãos fortes em seu range e o range do seu oponente deve ser capado, pois quando reduzimos o range do adversário, ele terá menos chances de ter uma combinação forte de mãos.
Se tudo isso acontecer, Ariel deve apostar 150% a 200% do pote no turn com suas melhores mãos e com seus melhores draws. Depois da overbet no turn, no river, ela pode apostar de 150% do pote até all-in com todas as suas mãos mais fortes e mais fracas,
Para entender como essas heurísticas funcionam, vamos analisar alguns exemplos. Ariel aumenta do lowjack (LJ), com , e o BB paga. O flop vem . Ariel aposta meio pote com top pair e é paga. O turn é um , Ariel aposta meio pote e o BB folda.
De acordo com o solver, essa seria uma boa situação para apostar 150% do pote com 40% do range.
Todas as condições foram atendidas. Ela tem várias combinações de mãos fortes: KK, QQ, KQ, AA, AK, KJ. O range do BB está relativamente restrito, uma vez que ele apenas pagou pré-flop, não deu raise flop contra uma aposta pequena no flop, o que ele deveria fazer com SPR tão baixo, caso tivesse uma mão forte; e por fim, o turn é uma carta que não ajuda praticamente em nada o range do Vilão.
Como resultado, temos um excelente cenário para uma overbet turn. Mas nos resta saber com quais mãos devemos fazê-la.
Para nossas mãos de valor, vamos apostar alto com top pair e kickers altos (em bordos secos), dois pares e trincas. Claro que se o river trouxer possibilidades de flushes e sequências ou o stack efetivo for muito grande, isso vai mudar com . Aprenda como analisar situação assim fazendo exercícios em solvers, isso vai aguçar sua intuição
E para balancear o nosso range, estes são os draws com os quais vamos fazer uma overbet:
Imitar como o solver vai se comportar com cada um dos draws é impossível, mas para nosso propósito, vamos simplificar nossa estratégia e fazer overbets apenas com nossos melhores draws (combo draws, strongest straight draws, flush draws altos). Nós não queremos mãos que tenham boas chances de estarem dominadas quando jogamos por stacks.
Mas o que acontece quando nosso adversário nos paga no turn? De acordo com o solver, ele deveria desistir de 61% das mãos, o que significa que o range do Vilão é significativamente forte no river, já que mesmo alguns top pairs podem largar no turn.
No river, nós não queremos fazer uma overbet com nosso top pairs, já que não seremos pagos o bastante por mãos mais fracas. Em 43% das vezes, nós iremos pedir mesa. No restante, vamos apostar o pote ou um pouco menos.
Vamos a mais uma mão. Ariel abre raise do hijack (HJ), com , e é paga pelo cuttoff (CO). O flop é , ela aposta 25% do pote e é paga. O turn é um , Ariel aposta novamente, desta vez 50% do pote, e o Vilão folda.
No turn, o solver prefere a overbet com mão dela (e com mais 14% do seu range). De acordo com nossas heruísticas, tudo está de acordo: o turn, muitas mãos fortes no range e o range do oponente capado. No entanto, com , ou , o solver prefere o slowplay. Mas aqui, nós nunca vamos fazer slowplay, já que nossa palavra do dia é ambição. E já que apostamos pouco no flop, nós realmente queremos deixar o pote grande para jogar por stacks com nossas melhores mãos. Por blefe, nós podemos continuar apostando com flush draws e AK.
Vamos supor que fizemos a overbet e nosso adversário pagou. O river foi um . O solver vai all-in com 40% do range. A pior parte do range que vai all-in é composta de overpairs, mas uma parte pequena de AQs pode ser jogada de all-in.
Por fim, vamos dar uma olhada em uma última mão, mas desta vez, Ariel não é agressora pré-flop. O CO aumenta para 2.5 bbs. Ariel defende o BB com . O flop vem e os dois jogadores pedem mesa. O turn é um . Ariel aposta meio pote e puxa.
Bem, o solver tende a fazer uma overbet de 150% do pote com a mão dela.
Estamos o turn, em um SRP e temos várias mãos fortes em nosso range (straights, trincas, dois pares e top pairs). Todas essas mãos querem jogar um pote maior. Por outro lado, o Vilão teve a chance de apostar no flop (e provavelmente ele deveria), mas ele preferiu não o fazer, o que diminui muito a chance de ele ter uma mão forte. O Nove no turn melhora muito pouco o range dele. GTOX mostra que o BB tem uma pequena nut advantage. Pelo fato de o CO ainda possuir mãos fortes que não apostaram, especialmente top pair com kickers ruins, o solver opta pelo check na maioria das vezes. Mas por temos várias mãos muito fortes em nosso range, temos o direito de apostar. O solver novamente gosta de fazer slowplay com mãos como e , mas pelas razões que vimos na mão anterior, nós vamos apostar.
Mas cuidado, nós temos tantos draws em nosso range, que não podemos incluir todos em nosso range de overbet. Nosso número de semiblefes deve ser aproximadamente igual ao nosso número de combo de valor.
Mas e se formos pagos? O river vem um e, bem, o solver vai all-in (isso é quatro vezes o pote) com trincas e sequências. Com dois pares, ele vai betar duas vezes o pote.
Em resumo, aqui nós desenvolvemos heurísticas que nos ajudam a utilizar overbets como parte de uma estratégia geral:
Jogadores iniciantes pode se sentir psicologicamente incomodados em usar esse estilo, já que isso aumenta a variância e stacks serão perdidos ou ganhados muitas vezes. Para superar essa barreira mental, é necessário parar de pensar na perda de dinheiro ou no constrangimento que podem acontecer. Em vez disso, desenvolva o prazer perverso de pegar todas as fichas dos seus adversarios. @@Isso e tudo pro hoje—e mantenham o equilibrio.